20 de julho de 2015

Sobre Splatfests e o meta-jogo da popularidade

Este vai ser um post com um tema bem específico: o meta-jogo de popularidade criado pelo modo como os Splatfests de Splatoon contabilizam os pontos das equipes participantes e porque eu acredito que ele é algo ruim, ou pelo menos questionável.

Parece complicado, e provavelmente 75% dos leitores deste blog já desencanaram de ler o resto deste post, mas vou explicar com detalhes para você, leitor solitário que não tem mais nada para ler na internet.

Comecemos então com…

Conceitos básicos


Meta-jogo: Sendo bem sincero, mesmo eu não tenho certeza absoluta do real significado desta expressão, provavelmente porque vejo ele ser usado de diversas maneiras em diversos contextos, e a própria página da Wikipedia trabalha dois conceitos separados. Também não sei se esta é a grafia correta da palavra em português, tenho a nítida impressão que não é para ter esse hífen, mas como eu já escrevi com hífen anteriormente neste blog, preferi manter assim. Se alguém quiser me corrigir, por favor o faça. Quanto ao seu significado, ou pelo menos aquele que eu tenho em mente quando uso a palavra: um meta-jogo é um jogo criado pelas regras e circunstâncias de um jogo mas que é jogado fora do espaço diegético do jogo pelos jogadores, é uma estratégia criada para melhor jogarem o jogo. Simples assim.

Popularidade: Algo que nunca conheci na vida, ao contrário de auto-piedade e tentativas desesperadas de chamar a atenção. De acordo com este dicionário, é o “caráter de uma pessoa que tem as simpatias do povo; estima pública.” De acordo com o que eu vou falar aqui, é “aquilo que a maioria prefere.”

Splatfest: Evento recorrente de Splatoon, onde os jogadores escolhem entre dois times e, numa determinada data, todas as partidas online contam pontos para seu time e um vencedor é coroado no final. Os participantes também são avaliados de acordo com o seu desempenho, recebendo pontos de experiência a cada partida para melhorar seu nível pessoal (esse nível só é válido durante cada Splatfest e é resetado na seguinte). Com base nesse nível e no desempenho do time, os jogadores ganham uma premiação, mais pra frente a explico com mais detalhes. Exemplos de times já usados: cães vs gatos, rock vs pop e montanhas-russas vs toboáguas.

Por mais magníficas que sejam as montanhas Baikal, localizadas na região sul da Sibéria, elas não possuem coqueiros infláveis, então me afiliei ao time toboágua.

Splatoon: Jogo lançado pela Nintendo para WiiU em maio de 2015. É um shooter em terceira pessoa onde você controla inklings, uma raça de seres que mudam de forma entre uma criança ou uma lula, as armas disparam tinta ao invés de balas/lasers/vacas e o objetivo dele, ao invés de eliminar os oponentes, é pintar mais território que o time adversário. Já falei dele antes, ainda estou jogando bastante e me divertindo horrores, recomendo para todos que possuam um WiiU. E, como não podia deixar de faltar, aqui está a música oficial que explica o jogo:


WiiU: Sexto console de videogame lançado pela Nintendo, em 2012. O primeiro da empresa capaz de gráficos de alta definição, seu principal diferencial é o gamepad, um controle com uma tela sensível ao toque. Não foi o mesmo sucesso de vendas que seu predecessor, o Wii, mas possui um público fiel e dedicado, como eu.

Nintendo: Empresa fundada em 23 de setembro de 1889, inicialmente como uma fabricante de cartas de hanafuda, um tipo de baralho japonês, e que no decorrer de sua história atuou em diversos mercados, até chegar no ramo de videogames, pelo qual é mais conhecida atualmente.

Videogames: Jogos eletrônicos interativos que exibem imagens através de algum tipo de exibidor de vídeo. Para grande surpresa de pessoas tacanhas que não possuem a menor perspectiva histórica, foram criado originalmente na década de 1940, e este é um fato muito bom para se saber quando estiver numa discussão com um desses humanos obtusos. Hoje em dia é uma indústria que fatura mais de setenta bilhões de dólares (de acordo com algumas fontes), outro fato muito interessante de se ter em mente quando debater com néscios desagradáveis.

Piadas que buscam o humor através de repetição e explicações desnecessárias: É o que eu estou tentando fazer aqui neste tópico, mas acho que já deu pra entender e está na hora de mover o assunto para frente.

Escolho o que eu gosto ou escolho o que acho que vai ganhar?


Para entender melhor a situação toda, comecemos com os resultados do último Splatfest que teve aqui nas Américas, montanhas-russas vs toboáguas:

Primeiro é revelado qual time foi mais popular…

…seguido de qual time venceu mais partidas…

…terminando com os resultados finais, revelando o vencedor.

Os toboáguas foram a escolha mais popular, ou seja, era o time com mais integrantes, mas mesmo assim o time das montanhas-russas teve mais vitórias e, no placar geral, foram os vencedores. Como podemos perceber, o placar final consiste da porcentagem de jogadores (popularidade) mais a porcentagem de vitórias multiplicada por dois.

Neste caso, o time que mais venceu foi o vencedor, superando a inferioridade numérica. Justo, não?

O problema é quando vemos os resultados do Splatfest das Américas anterior, cães vs gatos:

Mesmo esquema: time mais popular…

…time com mais vitórias…

…e time vencedor. Estes screenshots estão diferentes dos anteriores porque não fui eu quem os tirou, peguei eles deste site. Quando saiu os resultados deste Splatfest, ainda não tinha em mente escrever este texto, então não salvei as imagens.

Os cachorros foram muito mais populares e, mesmo tendo vencido menos partidas, foram os vencedores. O mesmo aconteceu no último Splatfest europeu, comer vs dormir:

Como não tenho um WiiU europeu, peguei esta imagem deste link.

Enfim, acho que já deu para perceber o problema que temos aqui: popularidade acabou sendo decisivo para determinar o vencedor, deixando habilidade em segundo plano.

Só eu acho isto meio injusto?

Para mim, popularidade devia ou servir para equilibrar a contagem de vitórias (o que pode até estar acontecendo, a Nintendo não publicou os números absolutos dos Splatfests, apenas as porcentagens) ou apenas como curiosidade. Afinal de contas, numa disputa dessas, a habilidade dos jogadores deveria ser a única medida para determinar o vencedor. Num paralelo com futebol, é como se em todo jogo o Flamengo começasse com um gol de vantagem por ser o segundo time mais popular do Brasil (o primeiro é o meu time, o Não Gosto de Futebol Clube).

Só que agora vem a pergunta que eu estive fazendo para mim mesmo desde o primeiro Splatfest, e que foi um dos fatores que me impediu de ter escrito sobre o assunto antes: Isto realmente importa?

Afinal de contas, é só um game, não é como se essas disputas do Splatfest fossem cruciais para a vida e o bem-estar de alguém. É só uma diversão! Brincar de defender os toboáguas ou as montanhas-russas! Quer algo mais inofensivo que isto? Que diferença faz para os jogadores quem ganha ou perde, além de satisfação pessoal?

Para esta última pergunta, existe uma resposta: super caracóis marinhos de cristal. Ou melhor, as Super Sea Snails, um ítem que só dá para ganhar participando das Splatfests e servem para fazer certos upgrades de equipamento. Os vencedores ganham mais que os perdedores, mesmo que ambos tenham alcançado o mesmo nível pessoal durante o Splatfest.

Nível
Américas
Nível
Europa e Oceania
XP necessário
(total em parênteses)
Super Sea Snails
Fanboy/Fangirl Normal -- 2 (Perdedores)
4 (Vencedores)
Fiend Full-On 10 3 (Perdedores)
6 (Vencedores)
Defender Super 25 (35) 5 (Perdedores)
10 (Vencedores)
Champion Charismatic 50 (85) 10 (Perdedores)
16 (Vencedores)
King/Queen Eternal 99 (184) 18 (Perdedores)
24 (Vencedores)
Tabela das recompensas recebidas pelo Splatfest. Adaptada e traduzida deste link

Pode parecer pouca coisa, mas a partir do momento que há uma recompensa “real” (em oposição a uma recompensa social, onde a única diferença para o vencedor é o status e poder se gabar de ser o vencedor, por mais que seja uma recompensa virtual) ligada à vitória da equipe (e, no fundo, eu acho que tem que ter mesmo), o valor da vitória aumenta e, com isso, o incentivo dos jogadores a buscá-la também aumenta. Se bem que só o status já é o bastante para muita gente.

O problema é que a popularidade influencia o resultado. Se habilidade fosse o único meio dos jogadores influenciarem o resultado final, ou seja, jogando e ganhando, tudo bem, mas com o fator popularidade em cena, surge um meta-jogo ligado a ela, onde vale mais a pena se afiliar ao time que (provavelmente) é mais popular do que aquele que você realmente gosta mais. Em outras palavras, fazer parte da maioria é uma decisão estratégica para vencer. É parecido com o problema que ocorre em eleições políticas, onde acabamos nos treinando a votar em quem achamos que tem chance de ganhar, e não em quem acreditamos que é o melhor candidato.

Minha intenção não é falar de política neste blog, mas estes vídeos do CGP Grey
servem também para refletirmos sobre estratégias e meta-jogos de videogames.

E isso, na minha opinião, acaba estragando parte da diversão do jogo. Porque eu realmente prefiro a realidade boba onde nós, os esclarecidos, estamos defendendo os toboáguas com todas as nossas forças contra esses ignóbeis fãs de montanhas-russas do que aquela onde diversos jogadores combinam em fóruns ou organizam enquetes para prever quem é mais popular e focam em ganhar usando esse outro fator: popularidade.

Sim, eu sei que em alguns casos não dá pra saber qual dos dois times vai ser o mais popular, ou mesmo se dá pra influenciar tanto assim a popularidade final de um time só fazendo campanhas no Facebook, e eu também sei que, mesmo com as Super Sea Snails, as Splatfests não fazem a menor diferença no grande esquema geral das coisas, assim como que também sei que pra todo jogo que existe onde há um vencedor, alguém irá usar tudo que tiver ao seu alcance para alcançar a vitória, criando estratégias e meta-jogos podem ser tão ou até mais divertidos que os jogos em si.

Mas ainda assim isso me incomoda.

Porque no caso das Splatfests o meta-jogo é sobre popularidade.

E isso me parece ser, na verdade, sobre “normalidade”.

Para vencer, tenho que pertencer à maioria


Caso tenha algum químico lendo este post, quero esclarecer que estou falando do conceito comportamental de normalidade, que é aquilo que é visto como o “normal” pela maioria de uma sociedade, e não a concentração de uma solução química.

Tendo esclarecido isto, eu realmente fico incomodado quando pessoas se forçam a serem “normais” em detrimento do que elas realmente querem/gostam/acreditam ser, por mais que isso infelizmente seja parte da vida e todos tenham que aprender a conviver com isso em maior ou menor grau.

Só que uma disputa inocente de um evento online de um game não devia ser o tipo de situação onde as pessoas devessem ter que passar por isto.

Porque é o que o meta-jogo de popularidade das Splatfests acabam parecendo para mim: faça parte da maioria e seja recompensado.

Se o aspecto de popularidade servisse apenas como uma pesquisa de opinião, mais ou menos que nem o canal Everybody Votes do Wii, não haveria um problema. Se fosse que nem uma eleição democrática, onde apenas a opinião da maioria determinasse o resultado (sem discutir os méritos e problemas da democracia aqui, estou fazendo uma generalização para dar um exemplo, por favor), também não haveria um problema. Mas, a partir do momento que temos pessoas competindo e o esforço delas é em vão por elas não fazerem parte da maioria, eu acho que temos um problema.

Seja “normal” e vença. A vida pode até ser assim, mas não apenas ela não deveria ser, como eu prefiro que os meus jogos também não sejam.

Conclusão


Eu posso muito bem estar fazendo uma tempestade em copo d’água.

Como eu já ressaltei trocentas vezes neste post, Splatoon é só um jogo, os times das Splatfests são apenas uma diversão inofensiva e existem coisas muito piores no mundo que causam problemas reais para pessoas que não são “““““normais”””””.

Sem contar que eu posso muito bem só estar sendo um mau perdedor, já que eu fazia parte do time gatos, joguei até alcançar o nível máximo possível da Splatfest e vi meu time perder por não ser a maioria.

Screen que eu tirei do Splatfest de cães vs gatos, olhem no canto superior direito o meu nível: Cat Queen. Só não acho que meu esforço foi em vão porque Cat Queen é o título mais fabuloso que já ganhei na vida. 

Mas eu me irrito porque não consigo deixar de achar que a Nintendo está premiando a “normalidade” em detrimento à capacidade e a habilidade dos jogadores. E eu acho isso errado em qualquer situação, mesmo nesse microcosmo das Splatfests. Só porque você é parte da maioria, não significa que você mereça começar com uma vantagem.

Por isso, quero deixar registrado aqui: vou mandar um email para a Nintendo (em inglês) e para alguns sites comentando sobre isso que, a meu ver, é um problema, para ver se consigo fazer alguma diferença. Sinceramente, duvido que eu faça, mas me sinto na necessidade de tentar. E também não estou falando isto para incentivar você, leitor que sobrou, a mandar também - é só algo que quero fazer. Mas também não vou te impedir, se quiser me ajudar.

Quanto às Splatfests futuras, me comprometo com o seguinte: vou sempre escolher o time que acredito, mesmo que eu tenha certeza que ele vá ser o menos popular. Porque assim é mais divertido.

Links


• Dogs cheat Cats out of North American Splatfest victory (Gamezone)

• Latest Splatoon Splatfest Results Are In, Eating And Roller Coasters Emerge Victorious (Nintendo Life)

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